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Clássicos da TV: Trio Calafrio



Três cenários e uma roupa de gorila

 

por Alexandre César


Tosco até a medula mas tinha um charme mambembe

 

Equipe insólita. De pé Spencer (Larry Storch)o "estiloso" e 
Tracy (Bob Burns) o gorila, e sentado, Kong (Forrest Tucker)
 o líder natural" do grupo...


Imaginemos uma série mequetrefe, feita com orçamento franciscano (digno de Chaves) onde três personagens enfrentam fantasmas, monstros e outras entidades sobrenaturais ao longo do mundo, na verdade a ÚNICA casa mal-assombrada da cidade em que vivem, tanto que num dos episódios um deles indaga: -”Para que procurar o esconderijo? Todos nós sabemos que só há uma casa mal-assombrada na cidade!”


Dr. Frankenstein (Bernie Kopell) e seu monstro (William
 Engesser) aparecem no episódio "Dr. Qualoseunome"...


Pois é. Dentro dessas limitações, fora o reaproveitamento de sequências inteiras do grupo andando na sua charanga* e dos takes da mansão em ruínas, que era uma animação digna de Scooby-Doo, mas dentro do padrão das produções da Filmation de Lou Scheimer e Norm Prescot, Trio Calafrio (The Ghost Busters) era um seriado destinado ao público infantil, tendo os seus 15 episódios de 22 minutos cada veiculados em 1975 nas manhãs de sábado numa sessão de desenhos animados e seriados live-action do estúdio como SHAZAM! e a Poderosa Ísis.

De pé, o Barão Vermelho (Howard Morris) e seu mecânico 
Sparks (Robert Easton) no episódio "Só os fantasmas tem asas"...

A equipe era o melhor conceito do “qualquer coisa”: Kong (Forrest Tucker de Chisum Uma Lenda Americana), o líder mandão da equipe, Spencer (Larry Storch de F Troop), o meio tapado e Tracy (Bob Burns de Superman vs. the Gorilla Gang) o gorila** que silencioso, parecia ser o mais centrado do grupo, inclusive sendo o motorista. 


Tracy, com Eric, o Vermelho (Jim Backus) e Brunhilda 
(Lisa Todd) no episódio "Os Vikings Desembarcaram"...


A estrutura narrativa era sempre a mesma, atestando os malabarismos da edição de Rod Stephens (Arquivo Confidencial) para condensar a narrativa em 22 minutos: Surgia num prólogo no cemitério, a “assombração da semana” e após os créditos, em geral no escritório do trio, Kong manda Spencer e Tracy ir receberem a missão designada pelo misterioso Zero, seu chefe, seguia-se uma cena rápida dos dois no carro, e ao chegar numa locação de cidade cenográfica (sempre vazia, para não pagar figurantes) eles encontravam algum adereço ou atendiam um telefone ou pegavam um pacote, que trazia a gravação com a ordem da missão, parodiando o seriado Missão: Impossível, com o tradicional: -“Esta mensagem se auto-destruirá em 5 segundos!” e Tracy segurava o artefato com a gravação, contando nos dedos a contagem regressiva, que explodia em suas mãos deixando-o esfumaçado. Após algumas sequências no escritório, no cemitério e um “esconde-esconde” no castelo/ mansão mal-assombrada, culminando no uso final do desmaterializador de fantasmas, geringonça que mandava as entidades de volta para a terra dos pés juntos. Após isto, uma piadinha final. Nada que quem se acostumou às ridículas estrepulias do Chapolin Colorado ou de Os Trapalhões não estranhasse...

Até Morgana Le Fay (Ina Balim) deu seus pitacos por 
aquelas bandas, no episódio "Merlin, o Mágico"...

O tom utilizado na série era o pastelão descarado, centrado nos estabanados personagens, sejam eles bons ou maus, parecendo às vezes ingênuo e meio estúpido, com velhas piadas dos velhos shows de vaudeville adaptados aos anos 1970. A série também fazia referência ao cinema clássico; os nomes "Spencer"e "Tracy" foram tomados do famoso ator Spencer Tracy, enquanto o nome Kong, não dado ao gorila, era uma clara homenagem a King Kong. A despeito do tom mambembe, os atores tinham boa química juntos, oriunda de uma amizade cultivada nos vários filmes e seriados que compartilharam, fora as afinidades etílicas*** .


No episódio "Quem tem Medo do grande Lobo Mau?" o 
lobisomem (Lennie Weinrib) dava as caras, ou o focinho...

Nomes conhecidos da TV e cinema apareceram como “a assombração da semana”, e como trabalho é trabalho, deram a sua contribuição ao programa em participações deliciosamente farsescas como Ina Balim (Os Comancheros) como Morgana Le Fey; Severn Darden (A Batalha do Planeta dos Macacos) como Dr.Jekly ; Ted Knight (Mary Tyler Moore) como Simon de Canterville; Bernie Kopell (Agente 86) como o Dr.Frankenstein; Howard Morris (Alta Ansiedade) como o Barão Vermelho; Lisa Todd (Jake Grandão) como Brunhilda; Huntz Hall (a cinesérie Os Anjos da Cara Suja****) como Gronk entre outros, como até participações de membros da família dos produtores*****.

A feiticeira Salem (Leigh Christian) e o lacaio Gronk 
(Huntz Hall) no episódio "Which Whitch Is Which?"...

O orçamento limitadíssimo era uma parte visível da série, refletindo-se na cenografia e nos figurinos de Robert Turturice (Gata e o Rato), que até sabia aproveitar bem roupas de outras produções, dando personalidade visual aos seus protagonistas e convidados especiais. A cenografia refletia essa identidade visual pois fora as cenas iniciais, eram usados exatamente três cenários em todo episódio. O primeiro era o escritório do Trio, o segundo era o cemitério e o terceiro era o interior do castelo/mansão mal-assombrada, levando a fotografia de George Spiro Dibie (Tudo em Família) a tentar valorizar as pequenas mudanças aplicadas no interior do castelo/ mansão dependendo do fantasma(s) usados, pois o cenário básico e seu mobiliário permaneciam os mesmos. Mas aind assim haviam sutilezas como as mensagens irônicas que podiam ser lidas em duas das grandes lápides presentes em algumas cenas do cemitério em alguns episódios: (1) "Em Memória de Lucy Moonlite, 1817-1847, Ela acendia as nossas noites." (2) "Aqui repousa K.S. Walker, 1781-1972, oremos ao Senhor que ele se mantenha enterrado finalmente." Esta última lápide aparece como uma piada com o diretor de arte da série Keaton S. Walker e provavelmente outros membros da equipe... a musica de Ray Ellis (Ark II) e Norm Prescott (Flash Gordon a série animada) assumia o tom farsesco da coisa até porque como o público-alvo era o infantil não adiantava ter grandes pretensões, mas ainda sim tropeçavam num bom resultado.


Ao final, sempre se recorria ao "Desmaterializador de 
fantasmas". Não falhava....

Numa entrevista dada por Bob Burns (o gorila Tracy) em 2007, ele revelou que todos os 15 episódios foram gravados em 9 semanas dia sim dia não. Ele também revelou que o show estava bem cotado para uma segunda temporada, vindo como número 2 em audiência, vindo atrás da The Shazam!/ISIS Hour, mas a Filmation decidiu colocar mais dinheiro na sua atração de número 1 e assim, a tomada foi puxada, cancelando o programa.


Três cenários por episódio...

A série não é relacionada com o filme de 1984 Os Caça-Fantasmas (Ghostbusters, de Ivan Reitman) fato pelo qual a Columbia Pictures ter pago à Filmation pelo licenciamento do uso do título. Como o filme, a série gerou a sua própria série animada em 1986. Dan Ackroyd e Harold Ramis não tinham conhecimento da série quando escreveram o roteiro do filme. Quando foi anunciado o título do filme, já em produção, foi que descobriram que o nome já era usado, levando-os a fazer um acordo quanto aos direitos de uso do nome, que em seus detalhes não impedia os direitos de fazer uma animação e a Filmation produziu a sua própria série animada em 1986, após o sucesso do filme da Columbia. A animação contava com os filhos de Kong e Spencer, Jake e Eddie Jr., herdando o negócio de seus pais (com Tracy o gorila) em The Real Ghostbusters. O primeiro nome de Kong nunca foi mencionado na série original. Spencer era chamado de Eddie no segundo episódio, "Dr. Qualoseunome". Mas a série original permanecia desaparecida. Aqui mesmo no Brasil só foi veiculada em 1975 no Show das Cinco da Rede Globo e a animação derivada de 1986 chegou a passar no SBT, mas nunca mais vimos o trio original, segundo alguns, devido a seu aspecto tosco...

O logo do grupo...

Na entrevista de 2007, Burns lamentava, especulando que, segundo rumores, os tapes de todos os 15 episódios haviam sido destruídos após a firma haver mudado de mãos muitas vezes. Este rumor foi posto abaixo quando um set completo de tapes foi descoberto, e em sequência transposto para o DVD permitindo a uma nova geração conhecer esses bizarros aventureiros.

Spencer, e seu sósia-fantasma do mal "Big All", com os 
mafiosos "Fat Man" (Johnny Brown) e "The Rabbit" (Billy Barty)
 no episódio "O Macaco Maltês", parodiando o clássico "noir"...



Até agora ninguém se aventurou a lançar o DVD por estas bandas, nem foi resgatado em alguma TV a cabo, permanecendo desconhecida pela geração atual, que com certeza daria um crédito gaiato à tosquice do trio.


A animação derivada de 1986, depois que o filme "Ghostbusters" 
("Os Caça-Fantasmas" de 1984) reaqueceu o nome...

*: O carro do grupo fabricado em 1925, havia sido anteriormente usado como táxi na Argentina, e empregados da Filmation, que que gostavam de trabalhar em carros o mantinham funcionando.

**: Os produtores decidiram que o seriado seria o mais barato possível se contratassem um ator que tivesse a sua própria roupa de gorila do que se pagassem pelas duas coisas separadamente, então colocaram um anúnio de elenco procurando por “gorilas”. Eles encontraram Bob Burns, um montador de filmes que, junto com sua esposa, haviam feito uma traje de gorila em seu tempo livre. Quando Lou Scheimer (que fazia a voz de Zero, o nunca visto chefe da equipe) perguntou à Burns, já vestido com o traje, quem era o seu agente, Bob respondeu: - "Tarzan!" e Lou sabia ter encontrado o homem certo para o trabalho.

***: No livro "Creating the Filmation Generation", Lou Scheimer recorda que Larry Storch era um connoisseur de licores finos e Forrest Tucker um grande “virador de copos” e como parte de seus contratos, Storch queria dois galões de vinho branco sempre que estivesse filmando, e Tucker um case de cerveja. Após duas semanas, Tucker queria Jack Danielsao invés de cerveja. Segundo Lou: - "Eles tinham que entrar no set sóbrios e se manterem assim até o final da filmagem".


****: A série originou-se do filme homônimo de Michael Curtiz de 1938 com James Cagney e Pat O´Brien onde Hall fazia Crab, o bobalhão ingênuo do grupo. Diferente do filme original de forte apelo social, a série era uma comédia de aventuras


*****: O “fantasma” na cena de abertura era interpretado por Lane Scheimer, filho do produtor Lou Scheimer, que recorda no livro "Creating the Filmation Generation", que Lane era a única pessoa no set tão alta quanto Forrest Tucker, tanto que mais tarde seu pai o empregou como stand-in de Tucker durante a produção da série.


" We're "The GHOOOOOST BUSTERRRRS"!!! 
He's Spencer! He's Tracy! I'm Kong! YAAAAAHH!!!!"




Crítica – Filmes: Magnatas do Crime




Rei da Selva


por Alexandre César


Guy Richtie mescla reflexão, irona e metalinguagem
 

Guy Ritchie fala sobre a estabilidade e a necessidade de mudança, 
mesmo no mundo do crime...

 

Michael Pearson (Matthew McConaughey de Clube de Compras Dallas) é um talentoso americano, graduado em Oxford, usando suas únicas habilidades, audácia e pecha para a violência, cria um império da marijuana empire usando seus contatos com a aristocracia inglesa. Entretanto, nosso “Rei da Selva”, pegou gosto por uma vida estável e tranqula, junto com a sua bela esposa Rosalind (Michelle Dockery de Downton Abbey) e quer curtir a meia-iade sem se preocupar em olhar à sua volta. Mas, quando ele tenta vender o seu império para um amigo bilionário americano, uma corrente de eventos se inicia, envolvendo chantagem, decepção, desentendimentos e assassinatos entre gangs de rua, oligarcas russos, gangsters das Tríades chinesas e jornalistas enxeridos.

A "rainha" Rosalind (Michelle Dockery) e o "Rei" 
Michael Pearson (Matthew McConaughey): Cidadãos e 
filantropos de respeito na alta sociedade londrina...

Escrito e dirigido por Guy Ritchie (Aladdin, a cinesérie Sherlock Holmes) Magnatas do Crime (2019) reflete com ácida ironia sobre a virada da meia-idade e devido à ela, a necessidade de aceitar a mudança, e o aprender a se necessário, adiar os planos quando a realidade não permite a sua execução imediata (ou não?).
Ray (Charlie Hunnam) o "braço direito" de Michael, 
acostumado a fazer todo o tipo de trabalho necessário...

O roteiro de Guy Ritchie, em parceria com Ivan Atkinson & Marn Davies destila cinismo e ironia ao descrever o universo de Michael, Rosalind e o seu consignere Ray (Charlie Hunnam de Círculo de Fogo), o braço-direito e “pau-para-toda-obra”de Michael, que resolve qualquer parada, lidando com a galeria de tipos que povoam este universo de caras durões, mas capazes de questionamentos existenciais e conceituais, numa similaridade com, do outro lado do oceano, Quentim Tarantino.
Semeando problemas: Michael compra a antipatia do 
chefão da mídia Big Dave (Eddie Marsan) ao recusar
 um aperto de mãos numa reunião...

O trabalho obriga Ray em certa altura a orientar a jovem 
Laura Pressfield (Eliot Sumner) em encontrar um
 sentido para a vida...

Somos apresentados a tipos como Mathew (Jeremy Strong de O Juiz) o milionário yanque judeu (e gay discreto) que se interessa em assumir o negócio; Coach (Colin Farrel de Dumbo) treinador de uma academia de lutas e que tem uma relação paternal com os jovens que treinam no seu espaço; o l´der da Tríade chinesa Lorde George (Tom Wu de Velozes & Furiosos: Hobbs & Shaw) e o seu discípulo rebelde Dry Eye (Henry Golding de Podres de Ricos) que quer “tomar conta do pedaço” ; o inimigo figadal de Michael e barão da imprensa Big Dave (Eddie Marsan de Deadpool 2) e Fletcher (Hugh Grant de Um Grande Garoto) o repórter enxerido e canalha que é mandado por Dave para levantar os podres de Michael mas acha melhor propor uma chantagem.Tipos ao mesmo tempo estereotipados mas com uma palpabilidade que só uma boa direção de atores e um bom elenco é capaz de criar.
Amigos, amigos... Matthew (Jeremy Strong) é o bilionário 
americano interessado em comprar o negócio de Michael...

Uma grande sacada é a forma como o roteiro, em conjunção com a fotografia de Alan Stewart (Aladdin) e a montagem de James Herbert (Aladdin), Paul Machliss (Scott Pilgrim Contra O Mundo) flerta com a metalinguagem nos momentos em que Fletcher conta À Ray a história de Michael como se fosse um roteiro cinematográfico, e inclusive em certa altura inclusive citando A Conversação (1974) de Francis Ford Coppola e descrevendo as qualidades da película em 35mms e a vantagem do analógico sobre o digital.
Coach (Colin Farrel) é o dono de uma academia de lutas
 que "paga um dobrado" para manter seu rapazes na linha...
Fletcher discorre altos papos meta-linguísticos que dão o charnme à trama...
 
O desenho de produção de Gemma Jackson (Game of Thrones) e a direção de arte de Oliver Carrol (Han Solo: Uma História Star Wars) e Fiona Gavin (Outlander) delimita bem as classes e tribos sociais em seus espaços ora luxuosos e até um pouco saturados em alguns casos para diferenciar um rico elegante e refinado de um novo-rico cafona passando pelos ambientes austeros e funcionais da fazenda de Cannabis de Michael ou da academia de Coach, coisa que a decoração de sets de Sarah White (Bohemian Rhapsody) valoriza com detalhes sutis como o “peso de papel” que auda e muito à Rosalind num momento crucial da trama; complementados pelos figurinos de Michael Wilkinson (Liga da Justiça) que marca bem a distinção de origens e formação nos trajes elegantes e sóbrios de Rosalind, os ternos bem cortados de Michael e principalmente de Ray, nos moletons de Coach e seus rapazes, ou no casaco de trabalho de Fletcher.
O repórter Fletcher (Hugh Grant) levanta todo o passado
 de Michael, bem como suas atividades, visando uma 
chantagem rentável...

"M3#d@ acontece!" Os Toddlers, rapazes da academia 
se metem numa "roubada" e Coach se compromete com Michael
 e Ray a compensá-los pelo erro de seus "meninos"...

A música de Christopher Benstead (Gravidade, Dep. Musical) ilustra esse universo citadino heterodoxo mesclando vários ritmos em sua trilha incidental, que inclui nos créditos finais a versão sem cortes do video clipe "Box in the Bush" dos Toddlers e incluem Oh Shit” por The Pharcyde definindo a pluralidade de ritmos, que levaria Ray a se perguntar, como em certa altura ele o faz à um grupo de drogados: -” No meu tempo, se fumava um baseado, tomávamos um vinho e transávamos ouvindo Barry White! O que houve com vocês?”
Conflito de gerações: Dry Eye (Henry Golding) discorda de
 Lord George (Tom Wu) quanto ao rumo que as Tríades 
chinesas Londrinas devem tomar no negócio das drogas...
Rosalind, é o "porto seguro" de Michael, por quem
 ele tem uma paixão louca...

 Ao final Os Magnatas do Crime continua a tradição de Guy Ritchie de mostrar esse submundo do crime inglês com a mesma desenvoltura, e pique narrativo de sempre, que se não inova, diverte com suas reviravoltas e narrativa picotada, sem se levar a sério mas ainda sim tendo um dom fôlego para contar uma história e deixando claro como diz Mickey Pearson: -”Só há uma lei na selva: Quando o leão está faminto, ele come!”
A direção de arte e os figurinos marcam bem a diferença
 de mundos dos personagens de perfil mais popular dos 
protagonistas, bem diferentes de Matthew,
 que é a elite em pessoa...
- "Não basta ser o Rei da Selva,. Tem que agir como um!!!"
Que aprendamos a andar na selva tendo isso em mente...
 
- " O cara caiu na linha e o tren pegou... foi mal parceiro!" 
- " Pois é! Desculpa tá:!?"

Clássicos da TV: Battlestar Galactica





Eram os Deuses... 


por Alexandre César


Vinda no rastro de Star Wars, série tinha personalidade


O piloto exibido nos cinemas brasileiros em 1979, dublado
 e em sensurround, apresentava diferenças quanto à série...

Existem aqueles que creem que a vida aqui começou lá em cima, bem distante no universo, com tribos de humanos que podem ter sido os antepassados dos egípcios, ou dos toltecas ou dos maias, seres que podem ser irmãos do homem e que até agora lutam para sobreviver em algum lugar muito além daqui." (narrativa em off de abertura do piloto de Galactica: Astronave de Combate, dirigido por Richard A. Colla e Alan J. Levi (não creditado) exibido nos cinema brasileiros em 1979, em Sensurround* e dublado, recurso na época quase sempre usado apenas para as animações da Disney e alguns filmes ocasionais, a maioria dirigido ao público infanto-juvenil, mas agora estendido para uma parcela crescente do público que tem preguiça de ler legendas... Aqui, abertura da série original:
 https://www.youtube.com/watch?v=8hrd767Xzfk



Grande família: Jolly (Tony Swartz), Boomer (Herbert Jefferson Jr.), Sheba (Anne Lockhart), Comandante Adama (Lorne Greene), Athena (Maren Jensen), Apolo (Richard Hatch),Cassiopeia (Laurette Spang) e Starbuck (Dirk Benedict)...


Papai orgulhoso: Athena e Apolo, os filhos de Adama 
estavam sempre ao lado do líder, apoiando-o...


Em 1977 Guerra nas Estrelas (atualmente Star Wars) tomou de assalto as bilheterias mundiais resgatando a ficção científica como gênero de sucesso financeiro e se tornando o carro-chefe da cultura pop e deixando todos os outros produtores ávidos de conseguir uma fatia desse filão rentável escancarado pela aventura escapista de George Lucas. 

Design clássico: A Galactica tinha cerca de 1.445 ms 

de comprimento, sendo maior do que um star 

destroyer de "Star Wars"...

A frota fugitiva: Aqui (excetuando as naves 15 e 16) 
vemos a relação das principais naves do comboio 
fugitivo, liderado pela Galactica...



A partir de 1978 começaram a pulular nas telas do cinema (e da TV) inúmeros caça-níqueis com “um rapaz com uma arma de raios na mão e uma moça bonita vestindo malha metalizada na outra, enfrentando alienígenas borrachosos!” numa mostra do quanto a indústria cultural precisa reduzir tudo a uma fórmula estereotipada... no meio desta leva, um dos poucos produtos que conseguiu ganhar alguma personalidade foi Battlestar Galactica (na época Galactica Astronave de Combate) criada pelo veterano Glen A. Larson (Magnum, A Super-Máquina, Esquadrão Classe A) que lançada pela rede de TV americana ABC e, calcada livremente na premissa do livro Eram os Deuses Astronautas? de Erich Von Däniken, aludia às velhas civilizações dos egípcios, dos maias, dos incas, dos toltecas e outras tantas, que teriam sido descendentes de seres espaciais. Aqui, por ocasião do remake, temos um documentário de 2003 sobre a série com depoimento dos atores originais: https://www.youtube.com/watch?v=6Vs6LGEBeuk




Conde Baltar (John Collicos) eliminado no piloto mas poupado 

na série regular, pois para a série funcionar, era necessário 

haver um vilão relacionável para odiar...


O enredo da série sugeria que esses seres humanos "que até hoje lutam pela sobrevivência em algum lugar do espaço" seriam os antepassados dessas antigas civilizações, sendo os nossos “deuses astronautas”, criando assim uma cosmogonia com grande influência da doutrina mórmon**.


Starbuck & Apolo: As aventuras da dupla cairam no gosto

 do público graças à boa dinâmica dos atores...

Em sua época a série original era inovadora por causa da grandiosidade de seus valores de produção, com dois nomes oriundos de Star Wars: Ralph McQuarrie como artista conceitual e John Dikstra com a sua empresa Apogee Inc. nos efeitos visuais revolucionou o seu uso em seriados para a televisão, além da evolução dos enredos dos filmes em geral e dos filmes para a televisão em particular, especialmente dos filmes de ficção científica. 

 
Os "vipers" coloniais, tinham um design tão marcante 
quanto os "X-Wings" de uma saga passada numa
 galáxia "Muito, muito distante"...

 

Os "raiders" cilônios voavam em formação de três 

tal qual os japoneses na Segunda guerra...


 É claro que como se tratava de uma série de TV haviam limitações orçamentárias, portanto as sequências espaciais da Galactica e do lançamento e manobra dos caças, os “vipers” coloniais, bem como de seus rivais, os “raiders”cilônios, eram reaproveitadas ad nauseum, ficando depois de um tempo para o espectador mais atento, previsível o resultado da sequências, pois sempre víamos por exemplo uma saraivada de raios se aproximando de uma formação de três “raiders” (como os zeros da Marinha Imperial Japonesa), destruindo o do meio e cada veículo remanescente ia para um lado. Às vezes essa sequência (e outras...) era repetida com o filme rebatido, de forma a sequência ir no sentido contrário. Aqui temos duas compilação de algumas destas sequências usadas e reusadas várias vezes:  

ocasionalmente surgiam alienígenas borrachosos ao longo da série...

Os "Anjos do Espaço" eram a atração do cassino 

que aparecia no piloto da série...


Segundo a série, e posteriormente em produtos derivados, em um passado longínquo, Kobol, o planeta originário da raça humana não pôde mais suportar a vida e os humanos, organizados em treze tribos, tiveram um grande êxodo, indo a procurar um outro planeta em algum outro sistema solar. Milhares de anos depois de estarem instalados em novas colônias, com a evolução, a tecnologia avançou muito e a inteligência artificial usada pelos humanos ganhou status de forma de vida e consciência própria, se revoltando contra seus criadores por achar que estes não davam valor à sua existência***.

Um raider chega a uma nave-base cilônia. As sequências de
 vôo e de combate das naves eram repetidas (as vezes rebatidas)
 tantas vezes que se tornavam previsíveis...

A Nave-Base Cilônia. O design sofisticado das naves
 fez muito sucesso entre os montadores de kits...


Os cilônios se valeram de plano de combinarem uma conferência de paz e colocaram em prática a execução de um plano de destruição em massa (um ataque maciço digno de Pearl Harbor) que reduziu a humanidade a alguns poucos milhares de sobreviventes e sem alternativas, esses sobreviventes decidiram, sob a liderança do Comandante Adama (Lorne Greene de Bonanza), montar uma frota com todas as naves disponíveis, liderada pela Galactica, e partir à procura por uma lendária décima terceira tribo, que havia deixado Kobol antes das outras doze tribos e assim se dirigem "a um planeta brilhante conhecido como Terra"

Aqui neste link temos o vídeo de um colecionador que montou os kits de toda a frota fugitiva da série original: 

e aqui vemos uma relação dos kits baseados nas naves da série e de outras produções de Glen A. Larson: http://www.davesmodelworkshop.com/2017/07/incredible-original-1970s-filming.html



"Missão Galactica: O Ataque dos Cylons" foi o segundo 
filme feito a partir do seriado, que passou aqui nos cinemas...


Auxiliado pelo seu filho Apolo (Richard Hatch), e os pilotos Starbuck (Dirk Benedict), Boomer (Herbert Jefferson Jr.) e Jolly (Tony Swartz), o Coronel Tigh (Terry Carter) e as tenentes Athena (Maren Jensen) e Sheba (Anne Lockhart) que enfrentavam as tramóias do traidor Conde Baltar (John Collicos), aliado dos cilônios, que no piloto da série era executado, mas ao se efetivar a série a sequência foi reeditada, indo para o final do segundo episódio, poupando-o para ser o vilão recorrente e, introduzia-se o seu traiçoeiro braço-direito Lúcifer (no original, a voz de Jonathan Harris, o Dr. Smith de Perdidos no Espaço).


O centurião cilônio clássico: Mix de Darth Vader 
cíclope com torradeira cromada...


 Ao longo da série, a frota improvisada ia de planeta em planeta à procura da Terra, com os cilônios em seu encalço. Apolo relacionava-se com a viúva Serina (Jane Seymour), adotando o seu filho Boxey (Noah Hataway) após a morte desta. Como curiosidade tínhamos Muffit, o cachorro-robô, que era interpretado por uma chimpanzé amestrada metida na fantasia (!?!).



O coronel Tigh (Terry Carter) era o braço-direito de 
Adama,cuja lealdade era inquestionável...


"Eram os deuses.." Os capacetes dos pilotos 
lembravam as esfinges egípcias...


A série devido a seu alto custo teve uma única temporada (21 episódios de 40 minutos), sendo os seus três primeiros episódios editados no piloto que foi veiculado nos cinemas brasileiros em 1979 no sistema Sensurround, e mais tarde viria outro, Missão Galactica: O Ataque dos Cylons (1979) de Vince Edwards, Christian I. Nyby II foi um telefilme compilando os episódios “The Living Legend: Parts 1 & 2” e “Fire in Space” mostrando entre outras coisas o encontro da Galactica com a Pegasus uma astronave que escapou do grande ataque, comandada pelo Comandante Cain (Loyd Bridges, inspirando-se no Gen. George Patton) que inclusive era o antigo caso de Cassiopeia (Laurette Spang) quando ela era “socializadora” (cortesã) e interesse romântico de Starbuck. 

Boxley (Noah Hataway) e "Muffit", o cachorro-robô, 
que na verdade era uma chimpanzé...

Muffit sem a máscara...

 Também foi exibido nos cinemas brasileiros, por volta de 1980. Outro momento marcante foram os episódios 13 e 14 (“The Battle of the Gods -Parts 1 & 2”) em que surge a carismática e “milagrosa” figura do Conde Iblis (Patrick Mac Nee que fazia a voz do líder supremo cilônio) que propõe-se a levar os homens a um caminho de trevas (o demônio?), sendo confrontado pelos Seraphs, seres luminosos (anjos?) ou ainda os episódios 17 (“Greetings from Earth”) e 19 (“Experiment in Terra”) em que encontram um sistema que tem um desenvolvimento paralelo similar ao da terra da guerra fria havendo duas facções: Os Terrans (algo como a OTAN) e a Aliança Oriental (similar ao Pacto de Varsóvia) tendo no episódio 17 a presença de Lloyd Bochner, figurinha fácil na TV da época fazendo o Comandante Leiter da Aliança Oriental, numa paródia de oficial soviético e no episódio 19 os Seraphs aparecem de novo para orientar Starbuck a como lidar com a crise das duas facções.

 
O comandante da Pegasus, Cain (Loyd Bridges) era o
 "senhor que ajudava" Cassiopeia (Laurette Spang) na 
época do antigo ofício dela...

Vermelhos do espaço: Comandante Leiter 
(Lloyd Bochner) da "Aliança Oriental"...

 
No ano seguinte (1979) Larson reutilizaria muitos dos cenários, adereços e figurinos da série em Buck Rogers, uma outra série espacial, de custo mais barato, sem grandes pretensões épicas, com um espírito mas escapista e camp, mas isto, é uma outra história, e uma outra resenha...

Mais adiante o Conde Iblis (Patrick MacNee) o "Anjo Caído"
 aparece para tentar os humanos nos episódios 14 e 15...

Os seraphs, seres mais evoluídos tinham uma
 nave modelo "Cidade dos Anjos"...

 
O sucesso da série e dos telefilmes levou a se pensar numa nova série, resultando no ano de 1980 em Galactica 1980 (10 episódios) apostava numa nova geração de personagens, tendo do elenco original somente Lorne Greene (Adama) e Herbert Jefferson Jr. (Boomer) quando a Galactica finalmente chegava à Terra, mas na época contemporânea (os anos 80) por motivos de restrições orçamentárias e tentando atrair o público infantil havia os “escoteiros espaciais” grupo de criancinhas típicas de “comercial de margarina” que tinham super-habilidades, devido à gravidade da Terra ser bem menor do que a de seus mundos natais, repetindo o tipo de sequências que já estávamos cansados de ver em O Homem de Seis Milhões de Dólares. Obviamente fracassou após o seu melhor episódio****, levando os remanescentes das 13 colônias para uma longa hibernação, até que no início do novo milênio Ronald D. Moore repaginar o conceito para o mundo pós-11 de setembro...

Os Seraphs, seriam uma raça que se originou dos humanos
 primordiais e evoluíram a um outro patamar, quase divino...

Com bastante sucesso, a série foi veiculada no Brasil em 1981, na TV Globo e posteriormente outras emissoras como Record e Manchete, e depois Telecine Classic Movie onde nos acostumamos a ver o agora clássico final de quase todo o episódio (que por coincidência não deixa de ter semelhança com a cena final de Star Wars - Episódio V: O Império Contra-ataca de 1980) víamos a frota desmantelada de naves sobreviventes tendo a fanfarra inspirada de Stu Phillips e a voz em off do Comandante Adama, como se estivesse escrevendo num diário de bordo:  "Fugindo da tirania cilônia, a ultima Astronave de combate: Galactica, lidera uma frota fugitiva, numa busca solitária, de um planeta brilhante, chamado,..., Terra."

 
A série de 1980 "flopou" direto por decisões equivocadas...


*: Um sistema desenvolvido pela Universal que usava caixas de som extras distribuídas pela sala na premissa de propiciar uma maior imersão do espectador, mas aqui pela péssima manutenção das nossas salas resultava na maioria das vezes em apenas uma maior barulheira nas cenas de explosões e impactos, sem haver realmente qualquer modulação sonora significativa. O som apenas ficava MUITO mais alto do que o normal nas salas e incomodava mais do que proporcionar imersão. A Universal o usou nos filmes Terremoto (1974), Midway (1976), Terror na Montanha-Russa (1977) além do piloto da série.

**: Glen A. Larson (1937 - 2014), roteirista, produtor e criador da série, era membro da  Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, e pegou a cosmologia de sua igreja, mixando-a com as teorias dos “Deuses-Astronautas” e as mitologias egípcia, suméria, etc... colocando tudo no liquidificador no melhor estilo George Lucas e a transformou na série.

***: Segundo o universo expandido da série os Cilônios eram andróides ciclopes remanescentes de uma antiga civilização de répteis, e acreditavam em um Deus único (monoteísmo) e os Humanos em vários (politeísmo), causando conflito entre suas culturas.

****: O episódio A Volta de Starbuck é considerado pelo fandon o melhor desta segunda série ao retornar Dirk Benedict como o piloto que , ilhado num planeta junto com um cilônio desgarrado, vivenciando uma relação parecida com a do filme Inimigo Meu (1985) de Wolfgang Petersen, onde descobrimos que ele é o pai do Dr. Zee (James Patrick Stuart) um híbrido de humano com uma seraph, a raça de seres alienígenas humanóides mais evoluídos.
 
"- Ao seu comando!"



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